29 de out. de 2008

Epitáfio

Atenção! para quem está deixando a vida escorrer como água abundante, quando o tempo é de escassez:

Composição: Sérgio Britto

Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter arriscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer...
Queria ter aceitado
As pessoas como elas são
Cada um sabe alegria
E a dor que traz no coração...
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar...
Devia ter complicado menos
Trabalhado menos
Ter visto o sol se pôr
Devia ter me importado menos
Com problemas pequenos
Ter morrido de amor...
Queria ter aceitado
A vida como ela é
A cada um cabe alegrias
E a tristeza que vier...
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar distraído
O acaso vai me proteger
Enquanto eu andar...
(2x)Devia ter complicado menos
Trabalhado menos
Ter visto o sol se pôr...

fonte: www.letras.terra.com.br

24 de out. de 2008

De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O oeste é meu norte.

Outros que contem
Passo a passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
- Meu tempo é quando.

Vinicius de Moraes

22 de out. de 2008

curto meu corpo quando junto ao teu
corpo. Isso sim é algo novo.
músculos melhores, mais nervos.
curto o teu corpo,curto o que ele faz.
curto teu cosmos. e sentir a espinha,
curto teu corpo até o osso,tremida
-firme-lisa mente e que eu
de novo de novo de novo
beijarei. Curto beijar teu aqui e ali,
curto,tocar lento o,arrepio dos pêlos
elétricos,e o que vem sobre a carne
aberta...os olhos migalhas de amor.

quem sabe eu curto o tremor

sob mim você algo tão novo

e e cumming

21 de out. de 2008

?

Anteontem, eu era a perplexidade
Morrendo a solidão a dois,
Numa jaula de junco.
O tempo murchando impassível,
Em direção ao inevitável destino.
Indagava ao dia e à noite
O porquê de tudo, o porquê do nada.
E a resposta era o silêncio do monólogo travestido de sagrado.
Eu era o lobo arredio da estepe situado no cerrado,
Alimentando-me de restos de certezas,
Uivando para a lua imaginária,
Para que ela me iluminasse.

Ontem, a lua atendeu às minhas preces.
Veio a mão amiga, arrebentou as grades
E curou as marcas dos dentes da armadilha.
Deslumbrado com o espaço que me foi dado,
Eu quis segui-la como um cão domesticado,
Idolatrando aquela que me libertou.
Mas ela me esbofeteou a face lupina:
- Não se apegue por gratidão, segue em frente!
Eu sou apenas o espelho que te revelou a força de sua alma,
Grande demais para este mundo pequeno.

Hoje, vagando livre pela estepe travestida de cerrado,
Eu esbarrei em uma loba, errante como eu,
Sedenta de liberdade cúmplice como eu,
E levantei as orelhas, arregalei os olhos,
Senti o seu cheiro que me fez rodear e demarcar território.
Avancei destemido das dúvidas que assombram os solitários.
Ou foi ela que avançou?

Agora, deleito-me com a leveza da sua companhia.
Divirto-me com os nossos jogos de esconder e revelar.
Rio como há muito não ria a graça de sermos por inteiro.
Aconchego-me a ela e gozo cada milímetro de sua forma.
Copulamos como lobos e como humanos,
No desejo de permanecermos unidos,
Pêlo com pêlo, pele com pele, embriagados pelos três pontos de interjeição,
Ainda que tudo entre nós seja um ponto de interrogação.

c cardoso

20 de out. de 2008

Às vezes com a pessoa a quem amo
Fico cheio de raiva
Por medo de estar só eu dando amor
Sem ser retribuído;
Agora eu penso que não pode haver amor
Sem retribuição, que a paga é certa
De uma forma ou de outra.
(Amei certa pessoa ardentemente
e meu amor não foi correspondido,
mas foi daí que tirei estes cantos.)

Walt Whitman

fonte: isla negra.zoomblog.com

16 de out. de 2008

Hey Jude

Composição: John Lennon / Paul McCartney

Hey, Jude, don't make it bad,
take a sad song and make it better
Remember, to let her into your heart,
then you can start, to make it better.
Hey, Jude, don't be afraid,
you were made to go out and get her,
the minute you let her under your skin,
then you begin to make it better.
And anytime you feel the pain,
Hey, Jude, refrain,
don't carry the world upon your shoulders.
For well you know that it's a fool,
who plays it cool,by making his world a little colder.
Da da da da da da da da...

Hey, Jude, don't let me down,
you have found her now go and get her,
remember (Hey Jude) to let her into your heart,
then you can start to make it better.
So let it out and let it in,
Hey, Jude, begin,
you're waiting for someone to perform with.
And don't you know that is just you?
Hey, Jude, you'll do,
the movement you need is on your shoulder.
Da da da da da da da da...

Hey, Jude, don't make it bad,
take a sad song and make it better,
remember to let her under your skin,
then you'll begin to make it better
(better, better, better,better, better!)
Da, da, da, da da da, da da da,
Hey Jude...Da, da, da, da da da, da da da, Hey Jude...

fonte: www.letras.terra.com.br

o brasileiro prefere tv a livros

Hoje cedo, fui a uma clínica fazer exames médicos para confirmar o que eu já sei: tenho um bom coração, apesar do meu utilitarismo individualista. Fui lá, também, para verificar porque minha pressão, que normalmente permanece em um nível bom, tendendo para baixa, tem estado alta ultimamente, embora eu não seja banqueiro nem aplique na bolsa de valores. Como de costume, levei como acompanhante um livro: estou lendo a autobiografia de Eric Clapton, um dos meus músicos preferidos. Sempre estou com um livro na mão, lendo quando estou só ou à espera de algum evento. Enquanto aguardava ser atendido, lia, mas incomodado com o barulho da televisão que transmitia um daqueles programas matinais em que se entrevista o ator da novela do momento, aborda o último crime que chocou a cidade e depois ensina uma receita de um prato enviada por um telespectador. Parei para observar as pesssoas que também esperavam no saguão, umas vinte, em sua maioria atentas à tv. Notei que eu era o único que estava com um livro. E um determinado momento, um senhor de barba e cabelos longos e brancos, usando bermuda e tênis como um adolescente - provavelmente ele iria fazer um teste de esforço - passou a mão em um jornal e o folheou; depois, uma mulher sentou-se à minha frente e abriu uma revista semanal de notícias; um cidadão passou por mim com uma revista cujo conteúdo não vai além de fotos de celebridades em ocasiões de invejável lazer. É claro, não foi a primeira vez que observei a ausência do hábito de leitura das pessoas à minha volta, mas essa percepção sempre me desagrada profundamente, porque ela me lembra a razão do baixo senso crítico do meu povo, o que resulta, dentre as inúmeras possibilidades de errar nas escolhas que devemos fazer na vida, na eleição de representantes e governantes que jamais seriam escolhidos por pesssoas esclarecidas. É verdade que até a mim, que possuo um nível econômico privilegiado, assusta o preço dos livros. Dizem que o livro no Brasil é caro porque as pesssoas lêem pouco e as pessoas lêem pouco porque o livro é caro. Como escapar a esse círculo vicioso? Não sei a resposta precisa. Penso entretanto que é necessário baratear o preço, e, para tanto, a produção e a venda de livro não deve ser tributada e a produção de livros de bolso, com material mais barato, deve ser estimulada. Criar mais e mais bibliotecas públicas também é fundamental. Em vez de fomentar a compra de televisões (e automóveis), estimule-se a de livros, ou melhor, a aquisição de cultura. Quem sabe, assim, diminui o risco de o país ser conduzido por semi-analfabetos e por inescrupulosos que se aproveitam da ignorância.

11 de out. de 2008

Alguém disse que não gosta muito dos poemas que publico aqui, meus e dos outros, porque são tristes.  Alguns são mesmo, porque todos retratam a vida, e a vida não é só alegrias. Mas todos procuram alcançar profundidade. Tocar a substância. Como não se arrepiar com um poema como"A flor e a náusea", do gigante Drummond? Existencialista até a última letra, se de um lado ele causa angústia frente à inicial falta de sentido da existência que expõe, de outro ele se rende à esperança de que é possível superar tal absurdo dando sentido ao viver,  pela ação dirigida para a transformação do nada em ser, pela poesia que preenche o branco da folha, pela flor que fura o asfalto. Como não se alegrar com essa perspectiva, que é real?

A Flor e a Náusea

Preso à minha classe e a algumas roupas,
vou de branco pela rua cinzenta.
Melancolias, mercadorias espreitam-me.
Devo seguir até o enjôo?
Posso, sem armas. revoltar-me?

Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas em ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.
Quarenta anos e nenhum problema
resolvido, sequer colocado
Nenhuma carta escrita nem recebida.
Todos os homens voltam para casa.
Estão menos livres mas levam jornais
e soletram o mundo, sabendo que o perdem.

Crimes da terra, como perdoá-los?
Tomei parte em muitos, outros escondi.
Alguns achei belos, foram publicados.
Crimes suaves que ajudam a viver.
Ração diária de erro, distribuída em casa.
Os ferozes padeiros do mal.
Os ferozes leiteiros do mal.

Pôr fogo em tudo, inclusive em mim.
Ao menino de 1918 chamavam anarquista.
Porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo
e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!
passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.
Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde
e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

Carlos Drummond de Andrade

7 de out. de 2008

sede de viver

Bob Dylan tem razão: a dor é capaz de dar um toque de beleza a um rosto, porque a face que traz marcas suaves de sofrimento reflete vida bem vivida. Ora, não há vida sem dor porque não há vida sem envolvimento pleno, apaixonado mesmo, e não há esse tipo de envolvimento sem risco de perda e frustração, considerando-se que nada dura para sempre nem é exatamente como idealizado. Quem tem medo da dor tem medo de viver. E não adianta se proteger enclausurando-se, porque não escapará à mais dolorosa das sensações: a de estar-se morrendo minuto a minuto. Não se trata aqui de apologia da dor, que não sou masoquista. Trata-se de realismo, percebido bem pelos taoístas que vêm o positivo como complemento do negativo, o branco do negro, a noite do dia, o bem do mal, o ser do nada, o ying do yang...não existe um sem o outro. O valor da dor está no fato de que ela revela o valor do prazer. Estou entre os utilitaristas: é ético o que causa mais felicidade do que sofrimento a todos os que integram a relação, estabelecida com base na liberdade, na autonomia de vontade. Quando, na balança, a dor supera o prazer, algo está errado, é preciso reequilibrar a balança. Se, apesar do esforço, prevalece o sofrimento, o negócio é romper essa relação, seja com quem for, com o que for. E seguir em frente. Estou entre os que amam a vida e, por isso, apesar dos medos, em especial o de sofrer, não renuncio a ela. Antes, quero vivê-la plena e ser pleno no viver, como aconselha Fernando Pessoa.
"Behind every beautiful face there's been some kind of pain."

Bob Dylan

6 de out. de 2008

Que ser fascinante e, ao mesmo tempo, apavorante é o humano. Os seres humanos, tão distintos uns dos outros, apesar dos traços comuns. Eis uma boa pergunta: o que se destaca mais, a diferença ou a identidade? Impressionam os extremos: de um lado Hitler, com razão a maior encarnação do mal segundo o imaginário contemporâneo; do outro Gandhi, modelo de tolerância e de não-violência. É claro, nós todos temos algo de Dr. Jekill e de Mr. Hyde, e é hipocrisia afirmar que alguém é totalmente puro ou inteiramente corrupto. Não na espécie humana: nem Hitler era inteiramente mal nem Gandhi inteiramente bom. Chama a atenção, entretanto, o destaque que se dá na mídia à maldade humana. Um dia desses perguntei a uma jornalista o por quê e ela me respondeu que o jornalista tem a obrigação de informar a verdade, “doa a quem doer”, como diria o Boris Casoy. Eu não discordo dela, de jeito nenhum. Também acredito que o jornalista não pode jamais faltar com a verdade. Não por outra razão defendo de modo intransigente a liberdade de expressão e, consequentemente, de imprensa. Mas então, pelo ênfase dado ao que faz mal, cresce a sensação de que o mal tem prevalecido sobre o bem na maioria dos rounds, embora, até o momento sem knock out. O que provoca um pessimismo em nós, que não faz bem à saúde de ninguém. Durante um tempo, eu fiquei sem ler jornal de manhã cedo para não começar o dia com a sensação de que estava intoxicado pelo cheiro da putrefação humana. Por que , por exemplo, não focar mais a beleza e a genialidade de Machado de Assis à bestialidade de um Fernandinho Beira-mar? Que maravilha a atenção dada pela mídia ao centenário do falecimento do nosso escritor mais emblemático! Mas a regra é enfatizar a bandidagem, o que parece indicar que, na vida, brasileira pelo menos, se sobressai a corrupção e não a correção segundo a ética, a barbárie e não a civilização. Quem, com um mínimo de sensibilidade, em face da impotência, não se alienaria, inclusive por meio das drogas, legais ou não? Leiam Huxley! Ocorre que quem é consciente não é capaz de se alienar nem de se conformar, ainda que tente via álcool ou outras drogas. Devemos ir em frente como a vida requer, dispostos a vencer. Que a mídia valorize vencedores e quem quer vencer.

3 de out. de 2008

the nearness of you

Vale ouvir esta música na voz rouca e excitante de Norah Jones

Composição: Hoagy Carmichael / Ned Washington

It's not the pale moon that excites me
That thrills and delights me, oh no
It's just the nearness of you
It isn't your sweet conversation
That brings this sensation, oh no
It's just the nearness of you
When you're in my arms and I feel you so close to me
All my wildest dreams came true
I need no soft lights to enchant me
If you'll only grant me the right
To hold you ever so tight
And to feel in the night the nearness of you

fonte: http://www.letras.terra.com.br/

2 de out. de 2008

Olhos e bocas

Olhos redondos de espanto
Miram-me vermelhos e úmidos de dor
Por que? Diga-me o por quê
Eu que te amava tanto
Boca cerrada de ódio
Olhos desviando, olhos de horror
Azuis, verdes, castanhos, negros
Condenam-me a ser carrasco
Bocas mostrando os dentes, a língua
Boquiabertos, apontando-me o indicador
Você a empurrou do penhasco
Queda livre em direção do nada
Por que? Diga-nos o por quê
Ela que só pedia para ser amada
Um pouco, e ficou à míngua
A ver navio, vítima do delírio de um sonhador
Um louco, deseja ser livre, atacam-me em coro
Eu não fiz por mal, por falta de decoro
Foi a vida que me impôs a escolha: ou ela ou eu!
Bocas e olhos encaram-me perplexos
Sim, ou morria ela ou morria eu
Dizem os meus olhos, a minha boca
A voz firme embora rouca
De tanto dizer tudo passa só a morte não passa.

c cardoso